27 maio 2011

Piratas do Caribe - Navegando em Águas Misteriosas (Pirates of the Caribbean - On Stranger Tides, 2011)

Nosso colaborador Márcio Sallem retorna ao Vip é Fato deixando a crítica de mais um famoso filme que encontra-se ainda em cartaz nos cinemas, dessa vez é : Piratas do Caribe.

Revisitar o universo de Piratas do Caribe é uma experência recheada de boa nostalgia e é indiscutível que as memórias estejam associadas a um ótimo filme. Apesar de passados 8 anos, até hoje me recordo do primeiro enquadramento do quando víamos um Jack Sparrow obstinado caminhando despreocupadamente do mastro do seu navio até terra firme enquanto este naufragava lentamente, como se aquela fosse uma imagem corriqueira na vida daquele pirata e que viríamos a nos habituar nos demais filmes da série. Porém, o mais flagrante era que apesar de conter com uma das melhores atuações de Johnny Depp, a que alavancou sua carreira definitivamente e lhe rendeu uma atuação ao Oscar, nenhum dos três filmes da trilogia original dependia exclusivamente do talento e carisma do ator que, claro, não seriam tão bons sem ele, mas dispunham de uma direção segura, bons roteiros e atuações razoavelmente satisfatórias (nunca gostei do Orlando Bloom). A boa notícia neste quarto exemplar, Navegando em Águas Misteriosas, é que o pirata Jack Sparrow continua obtuso, traiçoeiro, engraçado e perigoso, no entanto, o filme depende demais dele para funcionar, tornando-se inclusive aborrecido e entediante em determinados momentos.

Para ilustrar a irregularidade desta nova aventura eu preciso simplesmente compará-la aos demais integrantes da franquia original. A começar da inexistência de alguma cena de ação irrepreensível ou memorável. Sim, abro um parênteses para o ataque das sereias na Baía de Whitecap que quase atinge a condição de inesquecível, até quando encerra estranha e abruptamente através da intromissão de Jack Sparrow destruindo o farol que teoricamente atrairia as sereias. Mas, se estas já estavam caçando e atraídas às iscas, porque elas simplesmente iriam embora? Fechando os parênteses, é impossível cogitar pôr no mesmo nível a primeira vez em que ouvimos a famosa trilha sonora de Hans Zimmer neste episódio (refrescando a memória, Jack parece determinado em buscar um sonho ou donuts preso no lustre do palácio real) com a fuga do pirata da forca no primeiro episódio ou a fantástica batalha em cima de uma roda gigante em movimento e o ataque do Kraken no segundo episódio. A falta de imaginação é tão grande que quando Jack batalha com Angélica (Penélope Cruz) pela primeira vez, é difícil não se recordar de sua luta com Will Turner enquanto tentava se livrar das correntes que lhe mantiam preso.

E convenhamos, a ação em Piratas do Caribe é muito melhor em terra firme do que nos convés do navio, e isto é um enorme obstáculo nesta produção que, durante 30 minutos, se passa inteiramente no mar, alternando entre os três grupamentos em busca da Fonte da Juventude: os Espanhóis, que pouco dizem para que vieram e apenas introduzem um desnecessário contexto religioso que contamina mais ainda o fraco roteiro de Ted Elliot e Terry Rossio, os Ingleses comandados por Barbossa (Geoffrey Rush) e os marujos de Barba Negra (Ian McShane). Durante essa fase "aquática", a narrativa consegue a proeza na série de se tornar repetitiva e enfadonha, e nem o motim no Vingança da Rainha Ana, o barco de Barba Negra, consegue afastar os entediados bocejos.

Por falar no barco de Barba Negra, é decepcionante como ele empalidece diante do Holandês Voador (dos dois episódios anteriores). Enquanto este contava com uma direção de arte cuidadosa e atenta aos detalhes, revelando inclusive um marujo que era um pedaço integrante do navio; o Vingança do Rainha Ana apesar de escuro e assustador, com suas grandes e imponentes velas negras, remetendo ao inferno nas chamas e labaredas sugeridas na sala do capitão, e marujos zumbis, perde a oportunidade de se destacar, revelando apenas em um singular momento o potencial destrutivo das cordas que ganham vida ou do lança-chamas dianteiro, o que é frustrante.

Barba Negra também surge como um vilão bastante despersonalizado e enfraquecido diante dos talentos inatos de Jack Sparrow. Nos episódios anteriores, os vilões eram assustadores e praticamente imortais, Barbossa era um morto-vivo e Davy Jones... hum, também, de certa forma, enquanto isso, Barba Negra tem inclusive um prazo de validade quando deverá ser morto por um homem de uma única perna (e a falta de imaginação do roteiro em fugir do óbvio prejudica até mesmo essa revelação). Se conceitualmente essa fugaz chama de vida poderia transformá-lo em alguém mais ameaçador, não é o que se enxerga no filme. Oportunidades não faltaram, pois ele detinha um boneco de vodu de Jack usado uma única vez e, que por motivos imbecis é atirado de uma cachoeira (a explicação da imbecilidade recaí no autor, um zumbi, aparentemente imbecil), e os poderes da espada que permitiam controlar de maneira plena o Vingança da Rainha Ana e um certo charme diabólico que Ian McShane acrescenta com uma boa atuação.

A decisão de escolher Rob Marshall para a direção parece ter aleijado o filme de um destino melhor. Ele até revela um bom timing cômico como o plano em que revela a captura de Jack Sparrow pelos soldados ingleses ampliando a profundidade de campo a cada corte ou a hilária cena em que Jack convence os marujos a realizar um motim, mas é questionável o porquê do diretor ter sugerido tantas coisas interessantes e abandonado-as em alto mar (novamente, os poderes do barco do Barba Negra, o vodu, a zombificação que nunca é usada no filme, o armário de barcos na garrafa, a insistência religiosa espanhola, ou mesmo pontualmente o esqueleto de Ponce de Léon que não deixa de acompanhar o mapa - e duvido se Jack Sparrow em outros episódios não roubaria o mapa apenas para ver no que ia dar). E qual o porquê de tamanha relevância à história de amor do missionário interpretado por Sam Clafin e a sereia Serena além de procurar dar uma historinha de amor igual a de Will e Elizabeth?

Rob Marshall também tem inquestionável participação junto ao fotógrafo Dariusz Wolski na má qualidade da iluminação do filme. Alguns poderiam dizer que é porque mais da metade do filme se passa à noite, e muitas vezes à luz de velas ou de um farol, mas não se esqueçam que a trilogia original também tinha esta mesma característica e nem por isso tinha quadros enegrecidos a ponto de tornar irreconhecível o rosto de alguns personagens.

Chegamos a Johnny Depp. Novamente personificando o capitão Jack Sparrow com carisma e charme, porém mantendo o ardil e a sagacidade de quem sempre tem uma saída improvisada, a verdade é que o ator consegue salvar do naufrágio evidente este quarto exemplar desde o reverente momento inicial quando o acompanhamos de maneira inédita. E mesmo que algumas piadas não funcionem tão bem, como à do primeiro ato relacionada à montagem de uma nova equipe, o ator consegue extrair o riso necessário para que esta aventura se mantenha no curso necessário. Penélope Cruz também é uma adição bem vinda, mais pela beleza e sensualidade. Finalmente, Geoffrey Rush continua sadisticamente mordaz como o pirata Barbossa.

Combinando ótimos efeitos especiais, recriando sereais lindas e perigosas, e a ótima presença de Johnny Depp e seu timing cômico, Navegando em Águas Misteriosas cumpre seu objetivo de reviver a franquia com uma boa aventura mesmo que com grandes furos no casco do navio.

Ou talvez seja efeito da nostalgia... ou da maresia!

P.S.: Após os créditos, no fim mesmo, uma cena revela o destino de um personagem

Escrito por Márcio Sallem e sua versão original encontra em seu blog Cinema com Críticas

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